Paulo Martins Coordena clube com princípios do futebol brasileiro nos Estados Unidos – Parte II
Portal Futebol de Ouro Brasil – Paulo Martins – Parte II
Como veio a proposta para você trabalhar com o futebol nos Estados Unidos?
Eu trabalhei por 2 anos com algumas equipes de futebol de base no país no início dos anos 2000, então em 2014 surgiu a oportunidade de voltar, mais ao invés de prestar serviços aos clubes americanos existentes a proposta foi de criar um clube no modelo do futebol praticado no Brasil e por consequência baseado nos princípios do futebol brasileiro. Então escrevemos o projeto do clube desde a parte do estatuto, visão, missão, até o método que seguiria e como ele se desenvolveria. E assim, pontuamos as principais características do futebol brasileiro e iniciamos o clube em 2014. A proposta é interessante porque envolve muitos profissionais brasileiros, alguns que já moravam nos Estados Unidos e outros que foram do Brasil pra lá, especialmente para trabalhar no projeto. Hoje temos cerca de 15 treinadores que desenvolvem o futebol de acordo com que se faz aqui no Brasil, desde ensinar a sair jogando de trás, sem ligação direta, jogar com a bola no chão, fazer viradas de jogo para fugir da pressão, etc. Contamos com cerca de 400 crianças no clube como um todo. Temos a parte competitiva que possui 25 equipes da categoria Sub-7 até o Sub-18 e também a parte formativa, que é uma espécie de escolinha para crianças pequenas do sexo masculino e feminino, entre 4 e 10 anos. O projeto está se desenvolvendo bem e está dando certo. Podemos dizer que já começamos a colher bons frutos.
Por que você acha que a proposta é diferente?
Primeiro porque o futebol nos Estados Unidos sofre influência do futebol inglês, tanto pela facilidade da língua como por outras similaridades da cultura. O futebol inglês é bastante objetivo e não é segredo para ninguém que se desenvolve através de ligações diretas, jogadas aéreas e com bastante contato físico, bem diferente do nosso. Como nossa proposta é desenvolver o projeto através dos princípios do futebol brasileiro, a primeira coisa que foge ao padrão de lá, é que, nós não buscamos nos testes de captação de jogadores, crianças ou jovens fortes e robustas, pois nosso jogo não será predominantemente físico. Nós priorizamos jogadores inteligentes e bem coordenados fisicamente. A habilidade ela pode ser ensinada através de processos pedagógicos e situações de jogo e a parte tática poderá do mesmo modo ser assimilada pelos nossos jogadores, procuramos estimula-los desde de cedo e então ela vai se desenvolver, desde que pelo menos atenda a padrões normais de coordenação motora, e isso está sendo feito. Outro ponto importante e que pelo menos uma vez por semana, todos nossos jogadores fazem uma aula de futsal, não para aprender este esporte propriamente dito, mas para utilizar esta prática para aprender a jogar e tomar decisões rápidas e em espaços reduzidos, o que acreditamos será muito útil no desenvolvimento do bom futebol. Os resultados estão aparecendo e o clube já começa a vencer os confrontos com os clubes maiores da região.
Quais dificuldade que estão enfrentando nesse início de projeto?
As dificuldades que nós enfrentamos são em relação a cultura das famílias, que investem e almejam resultados rápidos. Estamos passando que o foco não é o resultado na primeira semana de treinamento, mais sim no processo que vai se desenvolver a médio e longo prazo. Então buscamos a credibilidade, a confiança e tentamos mostrar que o resultado não é imediato, e isso para os pais é um pouco complicado para entender num primeiro momento. Ou eles amam o estilo brasileiro e estão com a gente ou eles vão experimenta e depois decidi se ficam ou buscam outros clubes. Essa é uma das dificuldades que estamos tendo, mais ano a ano, seguimos melhorando, o número de crianças e jovens vem aumentando e os resultados estão aparecendo. Outra dificuldade que enfrentamos são as peculiaridades da região. Estamos, na cidade de Phoenix Estado do Arizona, que é bastante quente, por isso temos super cuidados com hidratação, planejamento dos horários de treinos e jogos, os primeiros socorros em caso de incidentes são fundamentais para o sucesso do trabalho. Sem mencionar que precisamos pesquisar e conhecer a cultura corporal dos americanos da região, que deverá ser respeitada mesmo para ensinar a jogar futebol em nosso estilo.
Os brasileiros precisam chegar lá, buscar conhecer isso e tentar se adaptar o mais rápido possível e assim poder desenvolver seu trabalho. Outra situação é que diferente da realidade brasileira em esportes competitivos, os pais americanos participam assiduamente em todos os treinos e jogos que acontecem, eles estão presentes em massa. Então é preciso ter um bom relacionamento com os pais, e dar Feedback, sempre que possível. Tenho que ressaltar uma grande vantagem que nós profissionais brasileiros, levamos em relação aos americanos. Todos nós aqui somos formados em Educação Física, além de ter tido larga experiência como jogadores de futebol, e por isso, podemos aplicar todos os conhecimentos dos quais dispomos, tais como, conhecimentos de anatomia, fisiologia, treinamento científico, psicologia esportiva, pedagogia, didática, etc. Já os técnicos americanos somente precisam de um curso rápido, as vezes de 20 horas, as vezes online e já estão aptos a exercerem a função de técnico de futebol. Muitas vezes nunca jogaram e ainda costumam ter uma outra profissão, exercendo o cargo de técnico, como uma carreira secundária para completar sua renda financeira.
Como são as estruturas de campos para treinamentos e jogos do futebol?
As estruturas são no mínimo bem melhores que as nossas no Brasil. Os clubes de futebol de base aqui possuem a disposição, por parte da prefeitura, complexos com diversos campos. 05, 10, 15 e as vezes 20 campos, onde podem ter jogos e treinos, então a estrutura para a prática da modalidade no país não é um problema. O Futebol por aqui, desde minha passagem nos anos de 2000 já era muito praticado, já tinha muita gente jogando e agora tem muito mais. Hoje sem medo de errar podemos afirmar que o futebol até 16 anos é o esporte mais praticado pelos jovens americanos, meninos e meninas. Tem muita gente jogando.
Então os Estados Unidos pode se transformar em Potência no Futebol Profissional?
A questão de se tornar uma potência no futebol profissional é outra questão. Eles enfrentam alguns problemas com a lei do desporto por aqui. Exemplo: a lei do desporto do país diz que se o jovem adolescente estiver jogando em um clube de futebol, ela não pode participar de jogos escolares, no caso, high school. Do mesmo modo, se estiver jogando em um clube, também não poderá jogar os jogos universitários. A reciproca é verdadeira, ou seja, se estiver nos jogos escolares ou universitários, não poderão nem treinar e nem jogar em clubes de futebol. Não podemos esquecer que diferentemente do Brasil, onde os jovens querem ser jogadores de futebol profissional para assim aparecerem na mídia e ganhar muito dinheiro, nos Estados Unidos os jovens buscam a pratica esportiva para poderem ingressar nas universidades com bolsas de estudo. Haja vista, que o ensino é gratuito até o ensino médio, mas as universidades são caríssimas.
Você pega no Brasil uma classe de 100 alunos e pergunta quem quer ser jogador de futebol profissional, eu arrisco dizer que mesmo nos dias de hoje que caiu um pouco, pelo menos 90% desses alunos, sendo bom ou ruim tecnicamente, vão querer ser jogador profissional, até porque tem a questão da ascensão profissional, do prestígio, dinheiro, mudar a vida da família, querer ser o bastidor e querer ser ídolo. Nos Estados Unidos se você perguntar para um grupo de 100 alunos o que eles querem, eles vão falar que querem praticar um esporte para conseguir bolsa e ter uma carreira acadêmica para ser engenheiro, médico ou qualquer outra profissão.
Na prática, observamos que na idade entre 15 e 18 anos, onde no Brasil e no resto do mundo os jovens estão nos clubes profissionais, treinando intensamente e buscando a excelência, aqui nos Estados unidos os jovens com potencial para o futebol estão ingressando e jogando nas universidades para assegurarem sua formação acadêmica. O garoto vai terminar a universidade podendo optar em ser um engenheiro e ganhar US$ 200,000 dólares por ano ou ser um jogador de futebol e ganhar US$ 50,000 mil dólares por ano. Na maioria dos casos não retornam aos clubes e assim seguem na profissão que estudaram. Aqui as principais equipes profissionais possuem uma base fraca, pois os melhores optam por universidades. Então a questão de virar uma potência no Futebol, primeiro eles terão que mudar a lei do desporto ou injetar muito, mais muito dinheiro. O Basquete possui essa mesma dificuldade, mais eles injetam muito dinheiro na modalidade, então o jovem em vez de ir para a carreira ele vai para o Basquete.